10 janeiro 2009

Eu tenho dragões, você têm?



Que fique só entre nós. Por favor. Eu tenho um segredo, na verdade uma mania. Vou falar bem baixinho: gosto de acumular coisas!

Outro dia li uma história que me deixou muito triste. Era sobre um menino, quase um rapaz, que descobriu o tesouro de um dragão. Tudo bem que o garoto era uma peste, mas não merecia tudo o que lhe aconteceu.

O dragão havia acabado de morrer e, por sorte, ou azar, Eustáquio, esse era o nome do rapaz, havia acabado de chegar na caverna para descansar um pouco. Num primeiro momento ficou eufórico, queria carregar o máximo de jóias que conseguisse. Mas também não queria deixar nada para trás. O que fazer? Enquanto pensava, adormeceu.

Quando acordou se sentiu estranho. Já não era mais o mesmo garoto rápido e ágil de antes. Seu corpo havia se tornado pesado e lento. Ficou com medo de sair da caverna e deixar seu tesouro para que outro se apossasse dele. Mas sua sede era tanta, que a muito custo caminhou até o lago. Ao abaixar, não acreditou no que viu refletido na água: ele havia se transformado num enorme dragão!

Um poderoso dragão! Com asas, nadadeiras e escamas! Mas, todo esse equipamento, na verdade, não serve de muita coisa, pois sua enorme pança não lhe permite grandes voos, nem grandes caminhadas. Além do mais, vive com medo de deixar por muito tempo sua caverna sozinha, pois podem roubá-lo.

Por isso dragão não corre, não brinca, não toma sol, nem se diverte no lago e sua pele vai ficando acinzentada e cascorenta.

É uma vida triste a de dragão!

Não compreendia direito o por quê de, nos contos de fada, o bravo, e corajoso guerreiro, além de salvar a princesa e resgatar o tesouro, precisar matar o dragão com sua própria espada.

Achava isso uma animosidade! Não compreendia que dragão não é um animal e, que esta batalha terrível, acontece todos os dias dentro de nós mesmos.

Estas histórias não deveriam ser chamadas de infantis, pois crianças não têm dragões. Nós sim, adultos, é que os temos aos montes!

Também na minha compaixão pelo bichinho, nunca havia me perguntado por que um dragão necessita de um tesouro. E de uma princesa.

Ele é um ser fantástico. Dotado de grandes atributos: escamas e nadadeiras que o permitiriam desbravar todos os mares e oceanos, asas e pernas fortes para que ganhasse o mundo!

Se assim o fizesse deixaria de ser um dragão ocidental para se tornar um dragão oriental. Com toda a sua glória e poder.

Sim, pois é para lá, pro Oriente, onde vão todos os dragões que conseguem perceber que não necessitam acumular tesouro algum. Muito menos conservar donzelas na sua caverna. Que a liberdade e os talentos que possuímos ninguém nos tira ou rouba. Muito menos nossos afetos.

Chegando do outro lado do mundo, após longas caminhadas e longos voos, seu corpo tornou-se esguio e musculoso. A luz do sol faz brilhar suas escamas, agora de um tom vermelho dourado.

Ele é ornado com flores e recebido com festa. E não habita mais em cavernas escuras e bolorentas, mas altos tronos com bandeiras tremulantes.

Também dizem que ele se torna capaz de habitar os três reinos de tanto merecimento: o reino dos mortos, pois o conhece profundamente, o terrestre e os céus elevados. Poderoso esse ser, não é?

Enquanto isso seguimos aqui, com nossos inúmeros dragões. Olhos caídos, pele flácida e sem brilho, soltando fumaças fedorentas pelas ventas e carregando pesadamente o fardo das inúmeras coisas materiais que achamos que necessitamos ou um dia iremos precisar.