22 janeiro 2009

Sabedoria e felicidade



"Mais vale um pássaro na mão do que dois voando",

"Antes só do que mal acompanhado",

"Dar murros em ponta de faca"...

Fui um criança com dificuldade para entender o que os adultos falavam. Vivia tão imersa em meu próprio universo que tais frases (às vezes carregadas de grande sabedoria, outras de grandes preconceitos) só vieram fazer sentido quando as 'coisas' da vida real, da vida adulta, foram-se chegando.

Não as busquei. Mas era natural que viessem.

Uma a uma. As complicações que nos fazem parar diante do espelho do travesseiro molhado e dizer:" -Cresci!" Ou pior, "-Estou crescendo". Pois o fato não está consumado. Nunca estará.

A sensação é de uma fruta verde embalada em jornal e colocada em local escuro. E uma voz assombrosa no fundo: "- Hay que amaducerer!!!!"

Me desperto de pronto. Saio do torpor.

Fruta verde também é gostosa algumas vezes, com um pouco de sal...ou mesmo marrenta, azeda...Mas nada se compara ao perfume, à cor e ao sabor de uma fruta madura em seu próprio galho, ao sabor do sol e do vento.

Mas nem sempre temos acesso ao privilégio de um amadurecimento tranquilo, no tempo devido.

Outras vezes, muitas aliás, resistimos ao amadurecimento. Só deixando o passado de fruta verde para o de fruta madura, após uma verdadeira sessão de tortura.

É quando aprendemos a não ficar dando murros em ponta de faca. Que é muito melhor estar só que diante de alguém que não nos enxerga mais. Ou a nos submetermos a companhias que, na realidade, nada tem que ver com quem somos, almejamos, acreditamos ou desejamos.

Queremos tanto. Sonhamos tão alto, mas em certas situações nos contentamos com muito pouco. Migalhas de relacionamentos muito aquém do que podemos oferecer ou almejar.

É uma grande sabedoria não dar murros em ponta de faca. Apesar e ser tão óbvio que isso machuca demais.

Dizem que as pessoas mais sábias são mais felizes!

Para o Budismo o motivo de todo sofrimento é o apego. Vejo sentido!

Um dia talvez aprenda, como canta Lenine, a não "alimentar nada duvidoso", "nem dar de comer a cachorro raivoso". É um longo caminho pra mim que fiz isso por anos: aprender a parar de chutar cachorro morto. Entender que mais vale ser um pássaro só do que dois que pensam que estão voando.

10 janeiro 2009

Eu tenho dragões, você têm?



Que fique só entre nós. Por favor. Eu tenho um segredo, na verdade uma mania. Vou falar bem baixinho: gosto de acumular coisas!

Outro dia li uma história que me deixou muito triste. Era sobre um menino, quase um rapaz, que descobriu o tesouro de um dragão. Tudo bem que o garoto era uma peste, mas não merecia tudo o que lhe aconteceu.

O dragão havia acabado de morrer e, por sorte, ou azar, Eustáquio, esse era o nome do rapaz, havia acabado de chegar na caverna para descansar um pouco. Num primeiro momento ficou eufórico, queria carregar o máximo de jóias que conseguisse. Mas também não queria deixar nada para trás. O que fazer? Enquanto pensava, adormeceu.

Quando acordou se sentiu estranho. Já não era mais o mesmo garoto rápido e ágil de antes. Seu corpo havia se tornado pesado e lento. Ficou com medo de sair da caverna e deixar seu tesouro para que outro se apossasse dele. Mas sua sede era tanta, que a muito custo caminhou até o lago. Ao abaixar, não acreditou no que viu refletido na água: ele havia se transformado num enorme dragão!

Um poderoso dragão! Com asas, nadadeiras e escamas! Mas, todo esse equipamento, na verdade, não serve de muita coisa, pois sua enorme pança não lhe permite grandes voos, nem grandes caminhadas. Além do mais, vive com medo de deixar por muito tempo sua caverna sozinha, pois podem roubá-lo.

Por isso dragão não corre, não brinca, não toma sol, nem se diverte no lago e sua pele vai ficando acinzentada e cascorenta.

É uma vida triste a de dragão!

Não compreendia direito o por quê de, nos contos de fada, o bravo, e corajoso guerreiro, além de salvar a princesa e resgatar o tesouro, precisar matar o dragão com sua própria espada.

Achava isso uma animosidade! Não compreendia que dragão não é um animal e, que esta batalha terrível, acontece todos os dias dentro de nós mesmos.

Estas histórias não deveriam ser chamadas de infantis, pois crianças não têm dragões. Nós sim, adultos, é que os temos aos montes!

Também na minha compaixão pelo bichinho, nunca havia me perguntado por que um dragão necessita de um tesouro. E de uma princesa.

Ele é um ser fantástico. Dotado de grandes atributos: escamas e nadadeiras que o permitiriam desbravar todos os mares e oceanos, asas e pernas fortes para que ganhasse o mundo!

Se assim o fizesse deixaria de ser um dragão ocidental para se tornar um dragão oriental. Com toda a sua glória e poder.

Sim, pois é para lá, pro Oriente, onde vão todos os dragões que conseguem perceber que não necessitam acumular tesouro algum. Muito menos conservar donzelas na sua caverna. Que a liberdade e os talentos que possuímos ninguém nos tira ou rouba. Muito menos nossos afetos.

Chegando do outro lado do mundo, após longas caminhadas e longos voos, seu corpo tornou-se esguio e musculoso. A luz do sol faz brilhar suas escamas, agora de um tom vermelho dourado.

Ele é ornado com flores e recebido com festa. E não habita mais em cavernas escuras e bolorentas, mas altos tronos com bandeiras tremulantes.

Também dizem que ele se torna capaz de habitar os três reinos de tanto merecimento: o reino dos mortos, pois o conhece profundamente, o terrestre e os céus elevados. Poderoso esse ser, não é?

Enquanto isso seguimos aqui, com nossos inúmeros dragões. Olhos caídos, pele flácida e sem brilho, soltando fumaças fedorentas pelas ventas e carregando pesadamente o fardo das inúmeras coisas materiais que achamos que necessitamos ou um dia iremos precisar.