26 novembro 2008

" Eu não confio em ninguém com mais de trinta", Caetano Veloso


A mi tampoco, ou, muito menos eu.

Caetano tem razão. Aliás, o acho muito chato, mas um chato que sempre tem razão, o que dá muita raiva!

Já reparou que com o passar do tempo as como as pessoas vão perdendo o brilho no olhar? Como já não deslumbram-se mais com as coisas simples da vida?

Depois dos trinta reina o império da razão! Que depois de tanto vermos o quanto é ridículo e não dá resultados, lá pelos 60, voltamos ao 'império dos sentidos', que é muito melhor e mais sábio. Outro que sempre tem razão (e não é chato!) é Fernando Pessoa, e ele não perdoa: "Pensar é estar doente dos olhos!". Pois acontece que depois dos 30 quase todos pegam essa mania de 'pensar demais', 'pensar em tudo', pensar até no que vai comer amanhã, no que vai vestir no Natal, pensar no que o outro está pensando a seu respeito...

Adolescente não pensa, apenas vive. Tem os olhos bem abertos às belezas e aos prazeres que se afloram em cascata diante de si, e por meio dos olhos, ou dos sentidos, aprende. E com que facilidade! Aprendem tudo e qualquer coisa muito mais rápido. E com que simplicidade! Sem alarde, sem grandes planos bem elaborados e minuciosamente pensados!

Ai chega-se aos vinte, ainda os sonhos persistem. Ainda acreditamos que 'vamos dar certo', que nosso emprego será o melhor, que encontraremos o marido ou a esposa dos sonhos...

Fomos criados por pais que pertenceram a uma geração que acreditava que o sucesso é ter um bom emprego de carteira assinada e, como consequência, um bom salário. Que sucesso é ser casado com uma pessoa 'normal' e termos filhos, de preferência, também 'normais'. Nada, absolutamente nada que façamos que não seja isso serve, ou servirá, depois dos 30.

Só que os tempos mudaram. As relações de trabalho mudaram, a família mudou. Mas nós não mudamos. Queremos o mesmo sonho dos nossos pais. É como querer encaixar uma peça de um quebra cabeça que não pertence àquele espaço! Então, para não admitir que a peça não cabe, nos tornamos cínicos, criamos máscaras, fingimos que estamos felizes. Afinal temos tudo o que sonharam para nós, ou quase tudo.

E ficamos sem tempo para sermos de fato, para sentirmos a vida. Clarice diria:

" Não tenho tempo para mais nada! Ser feliz me consome muito."

Ainda bem que não tenho 30, e nunca terei (cada um tem a idade que deseja!). Passarei dos 20 aos 60, borboleteando por ai. Sentindo a brisa, o sol a chuva e não querendo nada, nada mais que isso!! O sonho dos meus pais devolvo a eles. Sei que foi com as melhores das intenções, mas faz parte da boa educação não ficar com aquilo que não nos pertence. Não é?

22 novembro 2008

Ter ou não ter namorado?


Este texto não tem nome nem autor certos. Uns dizem que é de Artur da Távola, outros defendem ser Drummond o autor. Também, uns falam que se chama "Namorada", outros, "Mamorados"...Incertezas a parte, o fato que o acho muito bonito, por isso ele está aqui!


"Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa, filosofia.

Paquera, gabira, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil.

Mas namorado mesmo é difícil.


Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio, e quase desmaia pedindo proteção. A proteção dele não precisa ser parruda ou bandoleira: basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.


Quem não tem namorado não é quem não tem amor: é quem não sabe o gosto de namorar.

Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento, dois amantes e um esposo; mesmo assim, pode não ter nenhum namorado!

Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema, sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho.


Não tem namorado quem transa sem carinho, quem acaricia sem vontade de virar lagartixa e quem transa sem alegria.


Não tem namorado quem faz pactos de amor apenas com infelicidade. Namorar é fazer pactos de felicidade, ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de curar.


Não tem namorado quem não sabe dar o valor de mãos dadas, de carinho escondido na hora que passa o filme, da flor catada no muro e entregue de repente, de poesia de Fernando pessoa, Vinícios de Moraes ou Chico Buarque, lida bem devagar. De gargalhada quando fala junto ou descobre a meia rasgada, de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia, ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo, tapete mágico ou foguete interplanetário.


Não tem namorado quem não gosta de dormir, fazer sesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele; abobalhados de alegria pela lucidez do amor.


Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos, quem não se chateia com o fato de seu bem ser paquerado. Não tem namorado quem ama sem gostar, quem gosta sem curtir, quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim-de-semana, na madrugada ou ao meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais.


Não tem namorado quem ama sem se dedicar, quem namora sem brincar, quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele.


Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.


Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando 200kg de grilos e medos (e culpas). Ponha a saia mais leve, aquela de chita, e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se de margaridas e ternuras e escove a alma com leves ficções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim.


Acorde com gosto de pêra e sorria lírios para quem passe debaixo da janela. Ponha intenção de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fadas. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteio.


Se você não tem namorado é porque não enlouqueceu aquele pouquinho necessário para fazer a vida parar e, de repente, parecer que faz sentindo".